O aumento do número de pessoas fazendo uso de substâncias químicas psicoativas tem conduzindo as diversas áreas da sociedade a colocar o tema drogas como uma questão prioritária, buscando soluções imediatas e pouco resolutivas.
A Redução de Danos, implantada no Brasil pelo Ministério da Saúde, através do Programa Nacional de DST/AIDS, é marcada por estigmas e preconceitos. Com o objetivo minimizar a epidemia do HIV/Aids entre a população usuária de drogas, propõe o tratamento humanitário, respeitando o usuário enquanto cidadão de direito. Caracterizada como abordagem humanitária, inicialmente reconhecida como estratégia de tratamento, por permitir a livre escolha em usar ou não drogas. Dessa forma, reconhecer a Redução de Danos como tratamento torna-se um desafio.
Os usuários de drogas protagonizam as ações de Redução de Danos, como no seu surgimento na Holanda aonde os usuários de drogas, diante da contaminação com o vírus da hepatite, solicitaram medidas de prevenção. Nesse momento surgiu um estigma: a Redução de Danos é vista como apologia ao uso de drogas, concebida apenas como uma forma de prevenção para as pessoas vulneráveis a infecção pelo HIV.
A Redução de Danos é na realidade o acolhimento dos usuários de drogas em sua integralidade, seus direitos, deveres, desejos e opções, respeitando, orientando, responsabilizando e possibilitando novas escolhas. Inclui a escolha de usar ou não drogas, desenvolvendo estratégias e ações que minimizam as conseqüências adversas geradas pelo uso.
Desenvolver a Redução de Danos é entendido por muitos como um ato de desrespeito à sociedade. Os redutores sofrem repressão, são marginalizados e repudiados. Dentro das políticas de governo, são vistos apenas personagens figurativos, já que não se propõe abordar o tema, realizar uma avaliação técnica/cientifica da sua efetividade.
Na prática, as ações de Redução de Danos são reforçadas positivamente pelos usuários de drogas que passam a ser acolhidos como cidadãos; possuidores do direito a saúde, a educação ao trabalho, ao direito de ir e vir, de fazer escolhas e tomar decisões.
Fornecer o cachimbo ou a seringa envolve o fornecimento de orientações à saúde, a forma segura de uso, os benefícios e conseqüências desse uso, propondo também aos usuários a vislumbrar outras opções possíveis. Estimulados a ter acesso aos equipamentos sociais como escola, unidades de saúde e outros serviços, os usuários de drogas são receptivos, disponíveis a ser imunizados contra a hepatite, aceitam bem o fornecimento do preservativo e trazem outras demandas.
A abordagem de policias embasada na lei que interpreta de maneira ambígua quem é usuário de drogas ou traficante, causa conseqüências nocivas à vida dos usuários. Nesse momento fica o registro do dano social desnecessário, sem fundamento real. O conceito de droga lícita e ilícita também é outro entrave. Se o uso for de droga ilícita a postura policial é diferenciada.
Escutar e acolher são ações importantes da Redução de Danos e para tal, é necessário estar próximo dos usuários, nos locais onde vivem, compram e usam drogas, já que esses locais possibilitam a escuta e o acolhimento qualificado, quando acessados através da busca ativa, desprovida de preconceitos. O fato de estar junto aos usuários não coloca em risco a integridade física ou moral de nenhum profissional ou pessoa.
Estamos, sim, indo até a margem delimitada pelos padrões convencionais da sociedade. Saímos do espaço das clinicas e consultórios para o local onde existe a demanda. Nos deparamos com a impotência, porque é impossível reforçar o convencional e o socialmente aceito, escutando e acolhendo a vulnerabilidade social das pessoas marginalizadas. Profissionais relatam dificuldade para desenvolver a Redução de Danos porque a sensação de estar à margem da sociedade é concebida como uma ameaça e gera o medo de perder o status que lhe é de direito.
Estando em consonância com as proposições contidas nos direitos humanos, com as políticas sociais e de saúde, a Redução de Danos vislumbra o tratamento digno aos usuários de drogas, no qual as pessoas não sejam relegadas à condição de dependentes químicos.
Considerando o conceito real de droga, todos nós, em menor ou maior proporção, em momentos de nossa vida, usamos alguma droga. Vivemos numa sociedade na qual o consumo de drogas, lícitas ou ilícitas, é comum; uma sociedade usuária de drogas.
Ao repudiar a Redução de Danos, negamos nossa posição dentro da sociedade e a própria ciência, que oferece uma enorme quantidade de drogas, proporcionando tratamento/melhoria (cronicidade) e cura de doenças.
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